quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

"A vaidade é definitivamente o meu pecado favorito"


Como quase sempre, necessito assistir a um bom filme repetidas vezes para chegar num nível mais adequado de análise. Advogado do Diabo foi um deles. Hoje, vendo a película pela terceira vez, percebi conexões incríveis e não posso mais negar a gigante admiração por Taylor Hackford, que é, sem dúvidas, um grande diretor.

O filme já tem mais de dez anos, mas minha intimidade com o Direito só tem algumas semanas. E, poxa! Como isso já foi o bastante para associar esse tema à rotina social humana! Além de religião e lei. Precisa-se de uma mente muito fera para linkar tão bem esses aspectos. O filme fala de ego, pecado, poder, julgamento, família, Igreja, lei, instinto, culpa, punição, Deus e o diabo. Poderia me remeter a inúmeras cenas (inclusive a que sempre me fascinou, quando Al Pacino descreve a "função" do pescoço para a alma e a intelectualidade femininas. Demais!), mas basta uma das últimas para significar a obra toda.

O grande discurso do diabo, ao se revelar no filme, é realmente pertinente para a vida humana e muito mais convincente para a realidade do que o que se prega na chamada "casa de Deus". Ele, que acompanhou o nascimento de tudo desde o início dos tempos, diz que o Século XX foi seu, e não foi mesmo? Duas grandes guerras que abalaram o mundo, os efeitos de uma bomba atômica e um cara chamado Hitler podem servir de exemplo. Deus interveio? E quando ri da ironia divina? Ganhamos vontades do corpo, mas, com elas, a proibição de usufruí-las. Ah! E um fardo imenso chamado culpa caso tivermos coragem de experimentar. Falamos de verdade interior e sentimento, mas nada como aquele afago no ego. Um intérprete de peso afirmar que o amor foi superestimado é algo artístico mesmo. O cinema não é uma indústria que fatura à toa.

E quando é indagado sobre as leis? Por que o diabo tem um empreendimento que mexe com a justiça? Ora, essa é a máquina legítima do poder através da qual se manipulam os passantes sonhadores, os quais acreditam fielmente no poder adquirido e se alimentam da vaidade que os revela como homens (aqui, nunca associados à figura celeste, que é só pureza e bondade). Mais uma vez, Dostoievski vem à mente e vou me referir aos crimes e castigos. As punições humanas e divinas não foram suficientes para vencer esse forte instinto de querer mais, de ser mais, de sentir. Essência. Por que não assumir logo? (Nietzsche, agora é só você!).

No mundo do Direito, aprendo sobre poderes, princípios, atos, discricionariedade e legalidade. Hoje, especificamente, aprendi que o ato do juiz não é discricionário, pois ele é "tomado pelo convencimento". Vejam só que bela saída para nos distanciarmos da possível falha da pessoa ao julgar (neutralidade inalcançável neste plano) e como se desvia o grande fator de decisão para o advogado e sua capacidade discursiva (quase aquele kairós dos gregos, lembra?). Tudo fruto do homem: o ato comunicativo, a definição do que é errado, as punições, a idéia do livre arbítrio, a figura do juiz etc. Quem, de verdade, tem competência plena para julgar? O personagem de Al Pacino, sem perder a vaidade, talvez possa responder com mais propriedade essa questão.

Nenhum comentário: