Imagine como seria o "não" se um dia ele se concretizasse. Feche os olhos por um minuto. E imagine. É esse o verbo que impera quando não podemos ver. A imaginação ganha suas asas mais potentes.
Em Ensaio sobre a cegueira, enxergamos isso e muito mais. Um filme que retrata a cegueira resultante de tanto exagero por parte da "lucidez". Em poucas palavras: é tanta coisa ao nosso redor que mal vemos o essencial, o que nos bastaria como seres vivos. Para percebermos isso, Saramago propõe um teste no qual a visão é desprezada e os homens são postos à prova em sua capacidade de sobrevivência e organização social baseados em todos os outros instintos e sentidos. Vale tudo, menos ver.
A realidade de cada um é, então, construída pela imaginação. E, por um instante, há organização em meio à desordem aparente. Sim, pois, ainda que guiados por seu próprio universo imaginário, cada um conflui com o coletivo no interesse pela permanência no mundo. Sem ser visto, o outro é percebido. E um diálogo ou um desejo flui a partir da sensação de uma nova presença física. O real se mostra com outro teor. Agora traz peso, emoção, calor, energia... ultrapassa a relativa aparência para se justificar.
É assim que o escuro dá vez ao claro. E que talvez o "não" deixe de ser. A vida acontece diferente, mais rica. Nova, sem cores e formas pré-definidas. Bonito e feio perdem sentido. Ela só pulsa em cada um e vibra no ambiente. Animais? Não, gente mesmo... Coisa de raça.
Reconheçamos: o "não" é um grande convite para o "sim". Imagine.